
Por muito tempo, todo o resto eu deixei no sereno e no topo da montanha ao alcance das aves de rapina.
Foram dias de solidão e angústia, no espelho da alma.
Verdade que voltei a mergulhar no mar enquanto o vento coreografava relógios, secando a terra e também a minha voz.
Virei pó ao visitar cerrados e caatingas; hoje escorri pelas matas fugindo dos abutres negros porque ouvi o coração batendo dentro da caixa, reverberando desejos secretos, perfurando caminhos dentro do peito do meu esqueleto...
Depois de um longo tempo, ritmamos juntos novamente, despertando orquestras entre os ossos, destruindo a melancolia.
E no meio da rua te devolvo!, nu como cabe a um aventureiro despreovido de pretensões ou histórias.
Eu sei, você também sabe, o tempo desenhou mosaicos em nossas retinas... É nelas que habito discretamente, como pérola no fundo do mar.
Cultivo silêncios solitários!
Plantei um sonho quente na musculatura frágil, protegida pela pele áspera e seca!
Jamais fugi do sol, nenhum dia sequer, persisti sempre com fé ritualística.
Com calma, sobre ouvidos, boca e mãos, pernas, ossos, soltei os cabelos e afinei olhares...
Inflado, danço para que um novo tempo surja feliz...
Com os pés no chão sinto que a próxima linha será dourada e quente como a música que ouço ao me lembrar de nós.
Será que você ainda gosta de música?
(Imagem: foto de Carlos Eduardo Ferreira)