Dia de Poesia – Walter Duarte – Mas…

Fosse a vida só de flores,

viesse quem se queria,

não existiriam dores,

… não haveria poesia

 

Sempre fosse o agora,

e eterna a felicidade,

ninguém mais iria embora,

… não haveria saudade.

 

Ânsia? Nada, nem um pouco,

a alma feliz, completa,

sem vazios ou sonhos loucos,

… não haveria poeta

 

Vida sem fim, permanente,

Chama eterna de calor,

Todos seriam sementes,

… não se morria de amor

 

Se eu nadasse em mar de rosas,

sem os espinhos reversos,

eu seria todo prosa,

… não haveria estes versos

Beijos

Acabo de descobrir que ontem foi o Dia Internacional do Beijo (que tanto pode ser comemorado no dia 13/04 quanto no dia 06/07). Vou postar textos de diversos autores, que falam sobre o beijo. Começo com o magistral Olavo Bilac:

Um beijo

Foste o beijo melhor da minha vida, 
ou talvez o pior…Glória e tormento, 
contigo à luz subi do firmamento, 
contigo fui pela infernal descida! 

Morreste, e o meu desejo não te olvida: 
queimas-me o sangue, enches-me o pensamento, 
e do teu gosto amargo me alimento, 
e rolo-te na boca malferida. 

Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo, 
batismo e extrema-unção, naquele instante 
por que, feliz, eu não morri contigo? 

Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto, 
beijo divino! e anseio delirante, 
na perpétua saudade de um minuto…

 

E mais Bilac

Quero um beijo sem fim,
Que dure a vida inteira
E aplaque o meu desejo
Ferve-me o sangue:
Acalma-o com teu beijo.

 

O Beijo Eterno - Idilio - Descubra Sampa

E sigo com Dominguinhos:

Tô com saudade de tu, meu desejo
Tô com saudade do beijo e do mel
Do teu olhar carinhoso
Do teu abraço gostoso
De passear no teu céu
É tão difícil ficar sem você
O teu amor é gostoso demais

 

E ainda Martha Medeiros

Foi um beijo… 

foi um beijo onde não importava a boca
só tuas mãos quentes me apertando pelas costas
nada estava acontecendo na minha frente
e a ansiedade que havia não era pouca
teus dedos perguntavam pra minha blusa
se meu corpo acolheria um delinquente
descoladas as línguas um instante
minha resposta saiu um tanto rouca

 

Quadro Gustav Klimt - O beijo

E Chico Buarque

Soneto

Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono

Ainda, Adélia Prado

A vida é muito bonita,
basta um beijo
e a delicada engrenagem movimenta-se,
uma necessidade cósmica nos protege.”

V-J Day in Times Square – Wikipédia, a enciclopédia livre

E encerro com Augusto Branco:

 

Te levarei ao inferno
para te dar um beijo ardente
E meus braços queimarão
Ao agarrarem teu corpo em brasa

Quero te ter louca, cálida,densa, inconsequente
Pra viver contigo um romance tórrido eternamente
E exorcizar de mim este sentimento que me abrasa

Te levarei ao inferno 
Pra que tu sejas meu paraíso
Te levarei ao inferno para te dar um beijo ardente…

 

Há muito, muito, a se falar do beijo. Do abraço, da paixão e da saudade. Mas hoje passei a palavra a outros…

 

Dia de poesia – Hilda Hilst – Tenta-me de novo

E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascívia
Nem omiti que a alma está além, buscando
Aquele Outro. E te repito: por que haverias
De querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.

Dia de poesia – Carlos Nejar – Aqui ficam as coisas

Nossa sabedoria é a dos rios.

Não temos outra.

Persistir. Ir com os rios,

Onda a onda.

 

Os peixes cruzarão nossos rostos vazios.

Intactos passaremos sob a correnteza

feita por nós e o nosso desespero.

Passaremos límpidos.

 

E nos moveremos,

rio dentro do rio,

corpo dentro do corpo,

como antigos veleiros.

 

Aqui ficam as coisas.

 

Amar é a mais alta constelação.

 

Os sapatos sem dono

tripulando

na correnteza-espaço

em que deitamos.

 

Os corpos

circulando

na varanda dos braços.

 

É a mais alta constelação.

Dia de poesia – Paulo Mendes Campos – Três coisas

Não consigo entender

O tempo

A morte

Teu olhar

 

O tempo é muito comprido

A morte não tem sentido

Teu olhar me põe perdido

 

Não consigo medir

O tempo

A morte

Teu olhar

 

O tempo, quando é que cessa?

A morte, quando começa?

Teu olhar, quando se expressa?

 

Muito medo tenho

Do tempo

Da morte

Do teu olhar

 

O tempo levanta o muro.

A morte será o escuro?

Em teu olhar me procuro.