
Ando nas ruas, agora tão vazias de vida, nessa cidade entristecida. Alguns poucos carros, e mesmo assim tão apressados. Por que tanta pressa?
A cidade fechou há mais de quatro meses, o país se desmancha, não há motivo para correr. Estamos todos morrendo.
Onde estão as crianças que brincavam nos parquinhos? Os idosos sentados nos bancos das praças? Os atletas correndo nas pistas?
Onde estão todos?
Por medo de morrer, enfurnaram-se nas casas, que permanecem fechadas. Enterraram-se vivos, famílias divididas, amantes separados, encontros cancelados. Por medo da doença, evitam o contato com todos os outros seres humanos. E, acaso alguém é obrigado a sair, esconde o rosto o sorriso e alegria atrás de uma máscara horrorosa. Não há mais sorrisos.
E, mesmo com todas essas medidas, as pessoas continuam a ficar doentes. E muitas morrem. O vírus foi uma bênção para os doentes: há mais de quatro meses que não se morre mais de doenças crônicas, neoplasias, problemas cardíacos, nada mais. Só do novo vírus.
Vamos viver, minha gente!!!!! Abram as janelas e as portas, saiam ao sol, celebrem a vida enquanto a temos! Porque todos morreremos. Nem antes nem depois, mas só no exato momento que nos foi planejado morrer. O medo nos mata em vida. A morte virá nos buscar, estejamos em casa, com a janela aberta fechada. Estejamos nas ruas, nos bares, nos cinemas. Onde estivermos, seremos encontrados. Dona Ceifeira não falha. E, na minha opinião, o melhor que temos a fazer, é viver enquanto não morremos. Para isso estamos nessa Terra adoentada pelo medo de morrer.
Tenho saudade da alegria da vida. De ouvir risadas nos mercados. Das lojas abertas. Da cidade movimentada. Das pessoas se cumprimentando com sorrisos e beijos. Das cafeterias simpáticas e com o infalível perfume do café no ar. Dos bares lotados no final do dia, com risadas e copos brindando.
Tenho saudade de viver.