Um dia chegará minha vez de partir.
Quando a Ceifeira vier para me buscar,
Pedirei que me dê um minuto a mais.
Um singelo minuto apenas.
E nesse minuto reviverei tanta coisa
Eu me lembrarei das – poucas – alegrias
E das tantas tristezas que um dia conheci.
Levantarei os véus das pesadas mágoas
E perdoarei todos aqueles que as provocaram.
Não quero levar nada comigo.
Deixarei tudo aqui.
Ela me olhará aflita porque estou demorando
E eu direi: – um minuto apenas, um minuto!
E abençoarei todos os que se preocuparam comigo
E um dia me fizeram feliz de alguma forma
E pedirei que o Pai perdoe e abençoe aqueles que
Me feriram sem se importar com meus sentimentos.
E me despirei das vaidades acumuladas neste mundo,
Para seguir sem bagagem, sem peso, sem lembranças.
Quando ela, impaciente, cobrar minha rápida partida
Eu direi: – um minuto, eu só lhe pedi um minuto!
E abraçarei minha mãe e meu pai
E meus irmãos e minhas irmãs
E direi: – não sofram – vocês me fizeram feliz!
Eu apenas parto antes de todos e os esperarei
E prepararei a chegada de cada um no momento
Certo de partirem para o lado de lá.
Impaciente, ela baterá o cabo da foice contra o chão
E dirá: – vamos, você está demorando muito
E eu direi: – você me deu um minuto de prazo, espere!
E então irei me despedir do meu amor,
Para que não sofra com minha falta e seja feliz;
Direi que parto em paz por ter sido amada e que
Seu olhar me ajudará a atravessar o espelho
E me dará coragem para não sentir medo, e ainda que
A lembrança do seu amor me guiará do outro lado.
Então, chegado o momento, olharei de frente
Para essa indesejada e inevitável pessoa e direi:
– Estou pronta, vamos lá!
E, em paz, eu partirei…