A todas as pessoas que passaram pela minha vida; às que ficaram e às que não ficaram; às pessoas que hoje são presença, àquelas que são ausência ou apenas lembrança…
Hoje vou repetir esse post, porque tenho esperança que esse dia há de vir…
A minha alegria é a melancolia. (Michelangelo Buonarroti)
Um dia vou ser feliz. Feliz mesmo. De verdade. Não essas pequenas alegrias que esticamos ao máximo para nos sentirmos felizes por algum tempo. Mas Feliz. Assim mesmo: Feliz.
Um dia, não agora.
Sou feita de saudade e melancolia.
Desesperança e ansiedade.
Isso não é ser feliz. Nem mesmo alegre. Para ser sincera, muitas vezes penso que felicidade é uma palavra que inventaram para que a humanidade fosse eternamente frustrada. Porque nunca vi ninguém exatamente, plenamente e ostensivamente feliz. Alegre, talvez, mas feliz? Nunca.
Mas um dia serei feliz. Prometo.
Nada irá sombrejar meu olhar, que será claro, límpido, luminoso, como só o olhar das pessoas felizes pode ser. E meu sorriso… nada o impedirá. Aberto, cristalino, verdadeiro – o sorriso de alguém feliz.
Meus braços estarão sempre ocupados num abraço sem fim e minhas mãos derramando carinhos em alguém que muito me encante.
Quando o amor o chamar, siga-o, ainda que suas maneiras sejam duras e íngremes; e quando as asas dele o abraçar, renda-se a ele, embora a espada escondida dentro de suas penas possam o ferir. E quando ele o falar, acredite nele… Ainda que a voz dele possa despedaçar os seus sonhos, como o vento frio do norte devasta o jardim florido…
Por que, além de o coroar, ele também o crucifica. Para além de seu crescimento, ele existe para a sua podação.
Mesmo quando ele subir a sua altura para acariciar os seus ramos mais macios que estremecem ao sol, também ele o desceria a suas raízes e agitá-las-ão aderidas à terra… Como polias do milho, recolhê-lo-á para si mesmo O debulha para fazê-lo despido… O peneira para libera-lo das suas cascas… O moe até que fique branco e puro.. E o amassa até que seja moldável… Pois, ele o cozinha em seu forno sagrado para você tornar-se pão sagrado… Para a Sagrada Festa de Deus!
Tudo isso o amor vai fazer para você, só para você saber todos os segredos do seu coração… E para que neste conhecimento, você chegue a ser um fragmento do coração da Vida…
Mas, se com medo, você só procurar a paz e o prazer do amor, É melhor que você cubra a sua nudez, e saia do caminho do amor, Para ficar no mundo sem estações, Onde riria, mas não todas as suas risadas, e choraria, mas não todas as suas lágrimas…
O Amor só da de si mesmo, e pega nada mas do que si mesmo… O Amor não possui, e não pode ser possuído… Por que o Amor é bastante á si mesmo.
Quando você amar, não deve falar, Deus fique no meu coração… mas fale, Eu fico no coração de Deus! E nem pense que possa dirigir o curso de Amor… Por que, o Amor, se achar você merecedor, dirigir o seu curso… O Amor só tem um desejo: para satisfazer de si mesmo… Mas, se você ama, e necessite ter desejos, deixe eles ser os seguintes: Derreter e ser como um ribeirão corrente, para cantar a sua canção pela madrugada. Saber a dor de tanta ternura… Ser ferido pelo seu próprio conhecimento de Amor… e sangrar com abundância da felicidade…. Acordar com a coração alado e agradecer mais um dia de Amor. Descansar ao meio do dia e meditar no êxtase do amor…
E voltar a noite com agradecimento…
Então, dormir com uma prece no coração para a sua amada, e uma canção de louvor no seus lábios.
Mas é o buraco em que vai entrar o eixo que a torna útil.
Molda-se o barro para fazer um vaso;
É o espaço dentro dele que o torna útil.
Fazem-se portas e janelas para um quarto;
São os buracos que o tornam útil.
Por isso, a vantagem do que está lá
Assenta exclusivamente na utilidade do que lá não está.
(TaoTe Ching, cap. 11)
Quando o nada é o que preenche, a utilidade está no não-espaço, enxergamos outro lado da realidade.
Nosso concreto, nosso visível, tátil, sensível, já não se impõe. Atravessamos o espelho e vemos o outro lado – exatamente o abstrato, o que não vemos, não sentimos, e encontramos conforto nessa outra realidade.
Quantas vezes nos agarramos ao que existe, enquanto, na verdade, queríamos apenas o que não está lá fisicamente.
Vivemos uma vida de apego ao material. Ao que vemos. Ao que podemos ostentar. Ao que sentimos, ao que podemos dividir. Ao que pegamos, ao que podemos exibir. Sem perceber que o maisimportante era o nada, o vão, o intangível. E não damos importância ao que realmente nos marca, nos alegra, nos toca e nos emociona.
Os detalhes valem mais que o todo. Os desvãos contam os segredos . Onde nada se mostra, tudo existe.
O que dói não são as lágrimas que vemos. Mas a dor invisível que as causou.
41 anos. Mas ainda queima como se tivesse sido esta manhã.
Atendo o telefone. Vem a pergunta: “Está chorando? Já chorou muito?”
E eu respondi: “Eu, chorar? Por que?”
E a bomba: “Ainda não sabe? Vinicius de Moraes morreu no amanhecer.” Então comecei a chorar…
Ele partira. Em uma aura de poesia, envolto em uma névoa de paixão.
Junto com a Aurora, ele se fora. Esperou sua chegada e com ela partiu. E ele sabia que a Aurora é fria.
“… Apaixonei-me da Aurora No meu quarto de marfim Todo o dia à mesma hora Amava-a só para mim
…. É que apesar de sombria Prefiro essa grande louca À Aurora, que além de pouca É fria, meu Deus, é fria!”
Nesse triste 09 de julho, ele que cantara a morte, quando mal amanhecia, com ela se encontrara.
A morte vem de longe Do fundo dos céus Vem para os meus olhos Virá para os teus Desce das estrelas Das brancas estrelas As loucas estrelas Trânsfugas de Deus Chega impressentida Nunca inesperada Ela que é na vida A grande esperada! A desesperada Do amor fratricida Dos homens, ai! dos homens Que matam a morte Por medo da vida.
(A Morte, Rio de Janeiro, 1954)
Não sei se ele “se” morreu de amores. Mas sei que ele amou. Muito. Sempre. E morreu sem saber quem pagaria o enterro e as flores. Mas nessa manhã, Vinicius teve sua Hora íntima… (Rio de Janeiro , 1950)
Quem pagará o enterro e as flores Se eu me morrer de amores? Quem, dentre amigos, tão amigo Para estar no caixão comigo? Quem, em meio ao funeral Dirá de mim: – Nunca fez mal… Quem, bêbedo, chorará em voz alta De não me ter trazido nada? Quem virá despetalar pétalas No meu túmulo de poeta? Quem jogará timidamente Na terra um grão de semente? Quem elevará o olhar covarde Até a estrela da tarde? Quem me dirá palavras mágicas Capazes de empalidecer o mármore? Quem, oculta em véus escuros Se crucificará nos muros? Quem, macerada de desgosto Sorrirá: – Rei morto, rei posto… Quantas, debruçadas sobre o báratro Sentirão as dores do parto? Qual a que, branca de receio Tocará o botão do seio? Quem, louca, se jogará de bruços A soluçar tantos soluços Que há de despertar receios? Quantos, os maxilares contraídos O sangue a pulsar nas cicatrizes Dirão: – Foi um doido amigo… Quem, criança, olhando a terra Ao ver movimentar-se um verme Observará um ar de critério? Quem, em circunstância oficial Há de propor meu pedestal? Quais os que, vindos da montanha Terão circunspecção tamanha Que eu hei de rir branco de cal? Qual a que, o rosto sulcado de vento Lançará um punhado de sal Na minha cova de cimento? Quem cantará canções de amigo No dia do meu funeral? Qual a que não estará presente Por motivo circunstancial? Quem cravará no seio duro Uma lâmina enferrujada? Quem, em seu verbo inconsútil Há de orar: – Deus o tenha em sua guarda. Qual o amigo que a sós consigo Pensará: – Não há de ser nada… Quem será a estranha figura A um tronco de árvore encostada Com um olhar frio e um ar de dúvida? Quem se abraçará comigo Que terá de ser arrancada?
Quem vai pagar o enterro e as flores Se eu me morrer de amores?
Ele, o imortal, morrera.
E sempre será não só imortal, mas o Poeta infinito.
A paixão em forma humana.
Deixou o mundo mais doce, pôs encanto em nossa vida.
E estará, sempre, entre nós. Porque sua Poesia não morrerá jamais.