Trinta raios convergem para o meio de uma roda
Mas é o buraco em que vai entrar o eixo que a torna útil.
Molda-se o barro para fazer um vaso;
É o espaço dentro dele que o torna útil.
Fazem-se portas e janelas para um quarto;
São os buracos que o tornam útil.
Por isso, a vantagem do que está lá
Assenta exclusivamente na utilidade do que lá não está.
(TaoTe Ching, cap. 11)
Quando o nada é o que preenche, a utilidade está no não-espaço, enxergamos outro lado da realidade.
Nosso concreto, nosso visível, tátil, sensível, já não se impõe. Atravessamos o espelho e vemos o outro lado – exatamente o abstrato, o que não vemos, não sentimos, e encontramos conforto nessa outra realidade.
Quantas vezes nos agarramos ao que existe, enquanto, na verdade, queríamos apenas o que não está lá fisicamente.
Vivemos uma vida de apego ao material. Ao que vemos. Ao que podemos ostentar. Ao que sentimos, ao que podemos dividir. Ao que pegamos, ao que podemos exibir. Sem perceber que o mais importante era o nada, o vão, o intangível. E não damos importância ao que realmente nos marca, nos alegra, nos toca e nos emociona.
Os detalhes valem mais que o todo. Os desvãos contam os segredos . Onde nada se mostra, tudo existe.
O que dói não são as lágrimas que vemos. Mas a dor invisível que as causou.
O que importa não são os braços, mas os abraços.
Um dia, apenas a ausência será a nossa companhia.
O que fica não é a presença, mas a saudade.
E o nada, o que mais nos preenche.
(Foto: Stock Photo)