Sirva o meu amor de voo.
Sirva a tua vida inteira
de azul.
Eu sirvo de pássaro.
(Terceto de amor)

Amadeu Thiago de Mello nasceu em Barreirinha, no Amazonas, em 1926. Ingressou na faculdade de medicina, mas abandonou o curso na metade, ingressando na diplomacia na década de 1950. Foi adido cultural na Bolívia e no Chile, mas teve sua carreira interrompida pelo golpe de 1964. Durante a ditadura (1964-1985) foi preso e depois exilou-se no Chile, onde encontrou Pablo Neruda, um amigo e colaborador.
No exílio, também morou na Argentina, Portugal, França e Alemanha. Com o fim do regime militar, voltou à sua cidade natal e depois mudou-se para Manaus, onde viveu até sua morte.

Seu poema mais conhecido é Os Estatutos do Homem, onde o poeta chama a atenção do leitor para os valores simples da natureza humana. A preservação da Amazônia era tema presente em sua obra. A sua poesia escrita foi Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida que rendeu-lhe, em 1975, ainda durante o regime militar, um prêmio concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte e tornou-o conhecido internacionalmente como um intelectual engajado na luta pelos Direitos Humanos.
Em homenagem aos seus 80 anos, completados em 2006, foi lançado pela Karmim o CD comemorativo A Criação do Mundo, contendo poemas que o autor produziu nos últimos 56 anos, declamados por ele próprio e musicados por seu irmão mais novo, Gaudêncio. Suas obras foram traduzidas para mais de trinta idiomas. (Fonte: Wikipédia)

A aprendizagem amarga
Chega um dia em que o dia se termina antes que a noite caia inteiramente. Chega um dia em que a mão, já no caminho, de repente se esquece do seu gesto. Chega um dia em que a lenha já não chega para acender o fogo da lareira. Chega um dia em que o amor, que era infinito, de repente se acaba, de repente. Força é saber amar, perto e distante, como o encanto de rosa livre na haste, para que o amor ferido não se acabe na eternidade amarga de um instante. Confidência a Manuel na manhã de seu dia Hoje, meu filho, eu queria fazer um poema que fosse límpido e bom companheiro. Queria fazer um poema que fosse como um perdão, que fosse como uma espada, uma palma e uma esperança. Um poema que te seguisse como o pássaro ao veleiro, e como o servo a seu amo. Que te valesse na mágoa docemente, como o amigo que diz ao outro uma frase bem simples, cujo sentido nem importa: pois importa é que as palavras depressa se arrumem todas em ponte, dando caminho à ternura e à confiança. Amigo desses, que um dia bem te valesse, assim o poema eu faria se soubesse. Mas não sei. De lembrança, pois, te deixo em vez de poema sonhado – uma quase confidência. Um dia, no teu bornal de viagem, hás de encontrar coisas que nele arrumei à maneiro de farnel. Hás de encontrar tão-somente uns brinquedos, umas nuvens e umas palavras. No entanto o mundo eu só não te dei porque descobri que o mundo com todas as suas torres e todas as glórias – o mundo cabe, meu filho, o mundo cabe inteirinho na palma da tua mão.