Eu ouvi

Eu ouvi, Senhor, o rufar do batalhão indo para a guerra,

O pranto da mãe que se despediu de seu filho soldado

Eu ouvi, Senhor, o grito do menino refugiado ao cair no mar

Para morrer sozinho no meio da noite

Eu vi, Senhor, a lágrima que correu dos olhos da mãe enlutada

A tristeza na face das crianças famintas pelo mundo

Eu vi, senhor, a dor do idoso abandonado pelos filhos

E o corpo do bebê abortado aos quatro meses

Eu senti, Senhor, a angústia do doente que não foi atendido

O desespero do homem que perdeu seu emprego

Eu senti, Senhor, a agonia desse mundo abandonado

Que não mereceu o sacrifício do Seu Filho na Cruz

Se eu ouvi, Senhor, se eu vi e se eu senti, por que

Meu coração endureceu e já não sofro,

Já não sinto compaixão pelo irmão que sofre,

Não ajo contra a maldade humana tão exposta?

O que acontece, Senhor, conosco – estes seus filhos,

Que anestesiados assistem tanto horror e ignominia

E já não são capazes de intervir, de gritar BASTA!

E como um exército de cegos egoístas se encolhem

Caminhamos para onde, se deixamos os irmãos

Sofrerem os horrores da guerra, da fuga, do abandono

Da doença, do medo, da solidão intensa

E nada fazemos, como se pudéssemos nos dividir

Em dois tipos de humanidade – a que suporta e a que assiste.

E já não vemos, Senhor, em nós – humanos – a sua face divina…