Memória: Voo de alma

Ter penas não é ser livre / Nem nos pode libertar
Um par de asas apenas / Se falta o céu pra voar

(João Chagas Leite)

Voar… nada mais livre do que voar.

Símbolo maior da liberdade é o voo – talvez os pássaros sejam os animais mais livres da face da Terra.

Voar é contar consigo mesmo e acreditar. É confiar em si mesmo e na própria capacidade de ir além, quebrar fronteiras, ultrapassar limites. Ninguém pode voar pelo outro.

Assim, a primeira condição para voar é a auto confiança.

Mas também depende da sensação de liberdade. Não adianta ter asas nem ter o céu para voar, se a alma não for livre o suficiente para alçar o voo.

Há quem seja livre de alma e não pode voar por não possuir asas.

Há quem as tem mas não possui a alma livre para voar. A alma livre é a coragem.

Se o pássaro não tiver coragem de voar, ficará eternamente cativo, ainda que tenha asas e as portas da gaiola permaneçam abertas.

Quantos são prisioneiros vivendo em liberdade, quantos continuam livres, ainda que encarcerados?

Aqueles que têm alma de prisioneiro se resignam e aceitam qualquer limitação, qualquer prisão, mas quem tem a alma livre acaba por encontrar a liberdade.

Ainda que prisioneiro da Ilha do Diabo, ou de Alcatraz, ou da Torre de Londres.

Seja René Belbenoît, sejam Frank Morris e seus dois companheiros, seja o padre John Gerard. Ou, na literatura, Jean Valjean ou Edmond Dantès, dentre outros.

A lição que todos nos deixam é que a alma livre faz o homem livre.

O voo do pássaro simboliza o sonho de liberdade do homem.

Pássaro cativo não voa.

E voar é a imagem da liberdade.

(Imagem: banco de imagens Google)

Na guerra

Após uma reunião entre representantes russos e ucranianos na terça-feira (29), em Istambul, na Turquia, o vice-ministro da Defesa da Rússia, Alexander Fomin, anunciou uma “redução radical” das atividades militares nas regiões de Kiev e Chernihiv, na Ucrânia.” (Rafael Bevilacqua, 30/03/2022 09h21)

Olhou mais uma vez a foto da filhinha antes de guardar no bolso da farda. Estava sujo, cansado, faminto. Há dias de prontidão nesse ponto entre o nada e o lugar nenhum. Não entendia de guerra, mas precisou se alistar e agora estava nesse impasse.

Convocado, não tardou a se apresentar. Não acreditou que seria guerra de verdade.

Dias e dias de silêncio total, quando imaginava que a guerra era a cena de um filme, com tiros, explosões e gritos.

Nada disso.

Apenas dias de silêncio e alguns assovios. Alguma canção popular, um chamado entre amigos, e nada mais.

Faltavam dois dias para o aniversário da filha. E, na tropa, corria um boato que haveria rendição e que a guerra estava no fim. Questão de dias. E isso já durava há semanas.

Sonhava em voltar para casa, rever a mulher e a filha, tomar um banho de verdade e comer comida quente. Mas a sonhada notícia de que a guerra acabara, nunca vinha.

As costas doeram de tanto tempo na mesma posição. Levantou-se para caminhar um pouco e esticar as pernas.

Não viu de onde veio a bomba. Só viu o clarão. Nem ouviu a explosão e nem o silêncio que veio depois.

Para ele, a guerra acabou.

(Imagem: banco de imagens Google)

Dia de poesia – Mia Couto – Já não há domingos

Já não há domingos

Todas as vidas gastei
para morrer contigo.

E agora
…esfumou-se o tempo
e perdi o teu passo
para além da curva do rio.

Rasguei as cartas.
Em vão: o papel restou intacto.
Só os meus dedos murcharam, decepados.

Queimei as fotos.
Em vão: as imagens restaram incólumes
e só os meus olhos se desfizeram, redondas cinzas.

Com que roupa
vestirei minha alma
agora que já não há domingos?

Quero morrer, não consigo.
Depois de te viver
não há poente
nem o enfim de um fim.

Todas as mortes gastei
para viver contigo.

(Imagem: foto de Miguel Angelo Barbosa)

Poesia da casa – Dentro do seu abraço (Memória do blog, há dois anos)

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Dentro do seu abraço há um mundo inteiro

Todas as luzes e todas as cores que existem

Da mais pura paz do branco ao branco-azulado,

ao azul esverdeado alusivo a tantos mares acolhedores

Cores frias, cores quentes, tantas são as cores,

do veemente amarelo que acende todas as outras

aos mais intensos tons da paixão do vermelho e do roxo

E o repouso do preto total e aconchegante.

Dentro do seu abraço há um mundo inteiro

Todos os sons e notas musicais que existem

Da harpa celestial dedilhada por anjos do céu

quando me recosto em você no aconchego da paz

às melodias que cantam e choram amores idos e perdidos

 e aos mais estridentes e dissonantes acordes do rock

passando pelos convites do Bolero, tão fortes

à paixão dos acordes da Fantasia Improviso e ainda

aos mais intensos sons dos gemidos da paixão em brasa.

Dentro do seu abraço existe um mundo

Mais que apenas um simples mundo, mas muitos mundos

Mundos desconhecidos, sonhados, mundos conhecidos e vividos

da criança que um dia fomos e ainda a procuramos dentro de nós

dos jovens sonhadores esmagados pela dura realidade da vida

dos adultos que se pretendiam onipotentes e invencíveis

E hoje, já no nosso outono existencial, apenas conscientes

do nada que somos e do pouco que fizemos por nós.

Dentro do seu abraço existe um mundo

O mundo que nos resta neste final de vida

Que traz aconchego, reacende brasas adormecidas

Espalha as cinzas que cobriam o coração

E reaviva a paixão que ainda existe em nós.

Basta, para tanto, braços abertos e um sorriso verdadeiro

Que dizem: “vem” na acolhida apaixonada que

Cria todo esse mundo de encanto, que só existe

Dentro do seu abraço.

(Imagem: banco de imagens Google)

Dia de Poesia – Daniel Arruda Teixeira – Tu

Tu não estás longe de mim
nunca estiveste aliás.

Estás em mim.
Tu moras aqui
aqui dentro

És tu quem me acorda
e também quem me nina

Caminhas ao meu lado
de braços dados...
arrancas lágrimas dos meus olhos
arrancas sorrisos da minha boca

estás no meu pensamento
e nas minhas ações

és tu que controlas minhas mãos

nossas vidas se cruzaram naquele dia
ali eu nasci
tu entraste
nunca mais saíste

Tatuado em mim
tu estás
Não superficialmente na pele
mas internamente
na alma

(Imagem: banco de imagens Google)

Poesia da casa – Desejo

Queria ser o bálsamo para curar suas dores,
Ser a canção mansa que acalma seu coração.
Queria, com suas lágrimas, umedecer meus lábios secos,
E que meus braços fossem para sempre seu repouso.
Queria dissipar seu cansaço da vida, sua tristeza,
Que em meu corpo você encontrasse seu ninho.
Queria que meu amor tivesse o poder da luz,
E a meu lado nenhum medo do futuro existisse.
Queria ser para sempre sua fonte de carinho,
E a ternura doce que você sonhava encontrar.
Queria, depois que eu partir, ser a lembrança alegre,
Ter feito a diferença da felicidade em sua vida.
Queria ter a certeza da eternidade do nosso amor
E que esta paixão, fosse, então, infinita...

(Imagem: foto de Carlos Eduardo Ferreira)