39º dia – o tempo e a quarentena

Estamos hoje no trigésimo-nono dia de confinamento, portanto, amanhã serão quarenta dias que a população do país foi posta em isolamento social horizontal. Sem dúvida, uma verdadeira quarentena. Ainda que não tenha atingido 100% dos brasileiros, uma grande parcela dos brasileiros se encontra recolhida em seus lares. Mesmo porque lojas, shoppings, bares, restaurantes, academias etc., se encontram fechados.

Não tenho dados para avaliar se essa política de saúde alcançou a finalidade, de diminuir a incidência de contaminação pelo covid 19, se “achatou a curva”, se teve algum proveito. E não quero esse conhecimento. Estou analisando esse fenômeno do ponto de vista das pessoas confinadas.

E como estão essas pessoas?

A maioria em uma “montanha russa” de emoções.

De início, a maioria não acreditava que isso passaria de dez dias. Portanto, seria fácil acatar a decisão.

Mas não aconteceu. O isolamento virou bandeira política e desafio ao poder federal, e foi sendo prorrogado. O isolamento teve início ainda no verão. Estamos em pleno outono, ainda isolados.

Para a população mais favorecida economicamente ou que continua a receber seus salários, tem despensa e geladeira abastecidas, é servida por delivery quando deseja comida mais diferenciada, o isolamento está sendo período de férias em casa.

Existe, entretanto, o outro lado – todos aqueles que perderam ganhos, perderam empregos, viviam do ganho do dia, estão sem alimentos, sem futuro, e o desespero está batendo.

Mas vejo há traços comuns a todos – jovens, idosos, ricos, pobres… pontos que estão presentes na vida de todos.

Por exemplo, ninguém sabe a data. Ninguém. Nem a hora.

Simplesmente, para todos as pessoas que estão em segregação, o tempo perdeu a importância. Todos os dias são exatamente iguais, e não há mais dia e noite. Interessante se constatar que a maioria mudou inclusive seus hábitos, dormindo muito mais tarde do que o horário de costume e se levantando bem mais tarde.

Não há por que se levantar cedo, a não ser que se queira ter mais tempo de não fazer nada.

Concluo, então, que nossos conceitos de tempo se perderam.

Outro ponto interessante é a falta de interesse, seja lá pelo que for. Pessoas que queriam ficar em casa para realizarem algumas tarefas, não as realizam. Simplesmente, passam o dia em completa inutilidade. Vendo televisão, navegando na internet, sentado olhando para a parede…

Há notícias do aumento no consumo de bebidas alcóolicas. Não duvido. A maioria das pessoas passa muito tempo fora de casa. Chega para jantar, aproveita para um drink ou um vinho e vai dormir. Quando, por qualquer motivo, passa o dia em casa em algum final de semana, geralmente aproveita para comer, beber e dormir.

E agora, todos estão em um verdadeiro fim de semana em casa, portanto a rotina é essa: comer, beber e dormir.

E, fatalmente, o aumento na ingestão de álcool tem gerado aumento na violência doméstica, um círculo vicioso que conhecemos…

Dominados, na verdade, pela preguiça, todos estão se desacostumando de responsabilidades.

Um dia, fatalmente, essa situação vai mudar. Tão de repente como surgiu, o vírus estará dominado. E aí, o que acontecerá?

A realidade do país não será mais a mesma que deixamos do lado de fora da porta de nossa casa quando entramos e trancamos há mais 40 dias…

Quanto do comércio não reabrirá? Quantos empregos não existirão mais? O que acontecerá com a população que “carrega o piano” para os políticos existirem?

Quantos afetos estarão perdidos? Quantas relações rompidas?

Só o tempo dirá, mas, o mais intrigante: o tempo vai voltar? Ou o perdemos para sempre?