Continuamos em isolamento.
Como o jumento que persegue a cenoura pendurada em sua própria cabeça, seguimos em busca da redenção, da alforria, da libertação, da volta à vida, do fim da quarentena. Que, no meu caso, hoje chega em seu 112º dia.
Está além do insuportável.
São 112 dias sucedendo 111 noites exatamente iguais e sem perspectivas de viver.
Exatamente 112 dias sem vida.
E, pela janela da existência, vejo que há uma vida esperando lá fora. Isso tem de acabar.
O isolamento – temporário – era destinado à preparação, pelo poder público, dos hospitais e meios de combate à epidemia. Porém se tornou, ele mesmo, o isolamento horizontal, a única forma de combate à doença.
Estamos para completar quatro meses de preguiça explícita e incentivada.
Comércio fechado. Academias fechadas. Clubes fechados. Parques fechados. Igrejas e templos fechados. Até o futebol da molecada nos terrenos baldios está proibido.
Desconfio que a quarentena se tornou um fim sem si mesma.
Aparentemente estamos em um exercício de treinamento. Para nos tornarmos os bonecos de corda de um regime de força. Estão quebrando nossas resistências física e emocional. Não temos mais sequer o direito de querer. De sonhar. De esperar.
Tiraram nosso direito de ser feliz, de ter alegria. Quando viram que não podiam tirar nosso sorriso, nos obrigaram a usar máscaras em locais públicos.
Quantas pessoas – casais, famílias, amigos – estão separados há quatro meses, em razão dessa insanidade?
Sim. Insanidade.
Disse e repito: INSANIDADE.
Porque, se quatro meses depois, com a população submetida a cárcere privado, tanto sofrimento, tanto desemprego e tanta miséria, se os números de infectados e mortos só aumenta, está mais que demonstrado que isolamento é uma medida inócua.
Uma palhaçada.
Antes era um outro infectado. Provavelmente tiveram contato com o vírus em locais públicos, meios de transporte etc.
E agora? Famílias inteiras, no mais completo isolamento, com a doença.
Será que esqueceram a janela aberta e o vírus entrou na casa?
Ou ficar em casa, sem ar livre, sem sol, sem prazer, grudados na televisão e/ou internet, está tirando a resistência e a imunidade da população?
As notícias e as estatísticas não se combinam.
Para uns, é o apocalipse, o fim do mundo. Para outros, não é nada para se temer e todos passarão pelo contágio.
Em quem acreditar?
Fomos – todos nós – reduzidos a meros belos adormecidos. Trancados em casa. Privados de emoções e prazeres. Até quando?
E o povo, boiada descerebrada, tudo aceita e acredita quando ouve: é para seu bem.
Pelo andar da carruagem tudo tende a piorar – e muito.
O tecido social, já esgarçado pelas sucessivas crises, agora se rasga de vez, num vale-tudo que levará ao abismo.
Um dia teremos saudade dos tempos do isolamento.
Porque nuvens pesadas se aproximam. Um único horizonte se pode avistar. E ele é plúmbeo. Quando aqui chegar, aí, sim, será o apocalipse.