
“Lá vai a louca” todos dizem, alguns até com compaixão
Será louca, será sã, será lúcida? Como saber
Segue sem destino, sem ver e sem ouvir e sem falar
Mão crispadas, braços endurecidos, corpo curvado
“É louca”, repetem. Ela vai adiante, sem ter onde chegar.
Ela amou. Amou alguém apaixonadamente, mais que a si
Amou muito mais do que alguém já amou um dia
E esperou e acreditou. Por isso muito sofreu.
Para não ver sua partida, ela arrancou os olhos
E estourou os ouvidos para não ouvir o adeus.
Cortou a própria língua para não implorar que ficasse.
Seus braços e mãos se contraíram, para não mais abraçar
Calou na alma todos os tormentos, morreu por dentro
E desde então anda, a esmo, pelas ruas, calada, cega e surda.
“Ela é louca”, todos dizem. Mas ela não os ouve, sequer os vê
Mal pressente os perigos, escorraçada, por vezes apedrejada
Nada sente, nenhuma dor. Esgotou a capacidade de doer
De sentir, de chorar, de se lamentar. Nada lhe resta.
“É louca”. Não, não é mais louca. Agora é só uma coitada
Foi louca, sim, um dia em seu passado,
Louca quando amou mais do que devia.
(Imagem: banco de imagens Google)